Poemas publicados

FLERTE

A canoa
na areia
espia

O mar não se contém.

O olho das águas, 2009

“Carente de chão”

Carente de chão,
do jogo frio de lesmas e musgos,
do hálito molhado dos caracóis,
a borboleta lambe
letra por letra
a terra de sua saudade
larva.

O olho da águas, 2009

“Resignar-se à dor”

resignar-se à dor
do que demora para merecer
um ponto final

andar sobre virgulas,
engolir reticências
até que sangre
o nu

O olho das águas, 2009

A CERIMÔNIA DAS NUVENS

1.

Imenso papel azul
estende-se sobre a Terra.
Plural o que nele cabe,
acolhe a palavra nuvem.

A nuvem é singular
no mundo-dicionário,
mas se livre, é ave lépida,
vive em bandos, coletiva.

De seu ninho, vento e água,
flui bálsamo fecundo,
e a bruma deste cio
exige contemplação.

2.

Não cabe no peito
a cerimônia das nuvens
quando tinge de arabescos
o papel azul do céu.

É quando as nuvens estouram:
surgem velas peixes
monstros
bizarros gigantes que andam.

Se olhamos, não colhemos
a completa intenção
do celeiro transformante.

Mudam sempre os enredos
por contínua invenção?
Ou as formas são andantes
pois que buscam posição
para espiar nossos segredos?

Incomunicáveis,
as nuvens tecem casulo
de onde voarão
estrelas.

3.

O prazer do movimento
se retira,
ganha o ar novo alento,
geometria.

Surgem retas e quadrados,
olaria,
singular jogo de dados,
sintonia.

Surgem sombras ao esquadro,
contramão
de desejos ansiados,
ilusão.

Popular ensinamento
denuncia:
céu pedrento é chuva ou vento,
poesia.

4.

O dentro da palavra céu
esconde a seiva e os vapores,
tintura de sonhos e cores,
da alma das algas do mar.

Cardume de tintas agrestes
esculpe com asas e alarde
fantástica teia no oeste,
a paz em laranja das tardes.

De repente, o movimento
desmancha a fotografia,
rolam pedras, rola o vento
desperta a artilharia.

Céu de britas, não de nuvens,
arrebenta algum tinteiro
que guardava só o cinza,
cor retida em cativeiro.

Livre o cinza se espalha,
não de leve, se amontoa.
Vejo que entra desta dor
no segredo das pessoas.

5.

Encharcado,
de horizonte a horizonte,
vibra o ar
seus arpejos de fonte.

Pressionado,
roga o mar sua origem,
a saudade
impõe às nuvens vertigem.

Abafado,
todo o cinza se encurva,
principia
a cerimônia da chuva.

O olho das águas, 2009

A ALGA

Verte
do verdor
da alga
algo
além da cor.

Talvez
ao ver-se
vista,
a alga
pulse
o coração
de ciscos
e
a verdura
do verbo
alga
musgue
o olhar.

Talvez
ao me ver
vendo-a,
a alga
veja-se
tocada:
verde verde,
verde.

O olho das águas, 2009

Edival Perrini

Edival Antonio Lessnau Perrini nasceu em Curitiba-PR, em 23 de outubro de 1948, onde cresceu e reside. Saiba +

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