Poemas vivos

FATAL

Os moços tão bonitos me doem,
impertinentes como limões novos.
Eu pareço uma atriz em decadência,
mas, como sei disso, o que sou
é uma mulher com um radar poderoso.
Por isso, quando eles não me vêem
como se me dissessem: acomoda-te no teu galho,
eu penso: bonitos como potros. Não me servem.
Vou esperar que ganhem indecisão. E espero.
Quando cuidam que não,
estão todos no meu bolso.

Adélia Prado/ Bagagem/ 2003.

A SETA E O ALVO

manhã

Lavar o rosto das manhãs
e esperar o sol
de um dia sem máscaras.

Abrir-se em tato,
respirar o que sobrou da noite,
desenhar um caminho.

Edival Perrini/ Armazém de ecos e achados/ 2001

“VOCÊ FEZ QUESTÃO”

você fez questão
de dobrar o mapa
de modo que nossas cidades
distantes uma da outra
exatos 1720 km
fizessem subitamente
fronteira

Ana Martins Marques/ O livro das semelhanças/ 2015

A RODA

roda

Quando o rio cansa de ser
líquido,
fluir, fluir,
suas águas evaporam.

Quando as nuvens cansam de ser
efêmeras,
voar, voar,
suas névoas despencam.

Quando a chuva cansa de ser
lírica,
pingar, pingar,
suas águas rodam-se rio de novo.

Edival Perrini/ www.edivalperrini.com.br/ 2015

SEDUÇÃO

A poesia me pega com sua roda dentada,
me força a escutar imóvel
o seu discurso esdrúxulo.
Me abraça detrás do muro, levanta
a saia pra eu ver, amorosa e doida.
Acontece a má coisa, eu lhe digo,
também sou filho de Deus,
me deixa desesperar.
Ela responde passando
a língua quente em meu pescoço,
fala pau pra me acalmar,
fala pedra, geometria,
se descuida e fica meiga,
aproveito pra me safar.
Eu corro ela corre mais,
eu grito ela grita mais,
sete demônios mais forte.
Me pega a ponta do pé
e vem até na cabeça,
fazendo sulcos profundos.
É de ferro a roda dentada dela.

Adélia Prado/ Bagagem/ 1993

Edival Perrini

Edival Antonio Lessnau Perrini nasceu em Curitiba-PR, em 23 de outubro de 1948, onde cresceu e reside. Saiba +

Arquivo

Newsletter

Cadastre-se e receba nosso boletim informativo:

Aceito receber emails